A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) iniciou a revisão da segurança de uma substância química presente em alguns esmaltes usados para a técnica da unha em gel. A reavaliação ocorre depois de a União Europeia proibir, no início de setembro, o uso do chamado TPO, óxido classificado como cancerígeno, mutagênico e tóxico para o sistema reprodutivo.
A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) se posicionou contra a utilização das unhas em gel e reforçou que não recomenda o procedimento, justamente para reduzir riscos à saúde da pele e das unhas.
A decisão europeia se baseou em estudos laboratoriais realizados com roedores. Em altas doses, o TPO foi associado a alterações reprodutivas, como encolhimento dos testículos nos machos e redução da fertilidade em fêmeas. Apesar disso, especialistas destacam que ainda não há evidências clínicas robustas que comprovem esse nível de risco em humanos.
Novas diretrizes
No Brasil, o uso segue permitido. Segundo a Anvisa, qualquer alteração na regulamentação precisa ser discutida no âmbito do Mercosul, já que os países do bloco compartilham uma lista comum para cosméticos e itens de higiene. Como as diretrizes europeias costumam ser adotadas pelo Mercosul, há possibilidade de o veto também chegar ao mercado brasileiro.
A unha em gel se tornou uma das opções preferidas para alongar e mudar o formato das unhas, conhecida pela durabilidade que pode chegar a 20 dias. O método aplica camadas de gel acrílico sobre a unha natural, que endurecem ao serem expostas à cabine de luz ultravioleta. O TPO atua nesse processo como fotoiniciador, mas nem todas as fórmulas de esmaltes em gel contêm a substância.
O toxicologista da Sociedade Brasileira de Toxicologia, Anax Oliveira, avaliou que a exposição ao TPO durante o procedimento é considerada baixa, o que reduz os riscos imediatos.
“A unha tem uma camada de proteção, e a pele forma uma barreira. A quantidade absorvida é muito pequena. Isso não significa que os efeitos observados em animais se reproduzam necessariamente em pessoas que usam unhas em gel. Mas, por ter sido classificado como tóxico reprodutivo, a União Europeia adotou a medida mais restritiva e baniu o produto”, explicou.
Casos de alergia e reações adversas
Para além das preocupações toxicológicas, a esmaltação em gel pode causar outros problemas de saúde. Há relatos frequentes de dermatite de contato, ressecamento da pele e enfraquecimento das unhas. Como o caso da administradora Vanessa Lopes, que fez unhas em gel pela primeira vez há cinco meses e desenvolveu uma reação grave.
“Minhas unhas incharam, inflamaram e começaram a descolar. Fiquei com dor intensa, precisei de tratamento médico e até hoje não se recuperaram totalmente. Não quero mais usar gel”, contou.
O caso não foi um registro isolado, a estudante Rebeca Carvalho também passou por episódios de sensibilidade. “Já senti queimadura ao colocar a mão na cabine e tive alergia quando o gel encostou na pele. Fiquei com a mão vermelha e descascando”, relatou.
A dermatologista diretora da SBD, Rosana Lazzarini, chamou atenção para os riscos ocupacionais. Segundo ela, manicures e nail designers podem estar ainda mais vulneráveis por lidarem com os produtos várias vezes ao dia.
“A resina acrílica ultrapassa a luva de látex. Há casos semelhantes em dentistas que desenvolvem alergia ao manipular resinas usadas em restaurações. A exposição contínua preocupa bastante”, explicou. Para Lazzarini, a medida europeia deve acelerar mudanças na formulação dos esmaltes em gel, estimulando as empresas a buscar alternativas seguras.
Enquanto isso, no Brasil, a Anvisa segue analisando o caso, mas ainda não há prazo definido para uma decisão sobre a proibição do TPO.