Uma brasileira está por trás de uma das inovações médicas mais promissoras dos últimos anos. A química Lívia Schiavinato Eberlin, professora da Baylor College of Medicine, nos Estados Unidos, desenvolveu um dispositivo capaz de identificar se um tecido é saudável ou cancerígeno em apenas 10 segundos, durante a própria cirurgia.
A tecnologia, batizada de MasSpec Pen, já é chamada de “caneta que detecta câncer”.
Agora, o Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, conduz o primeiro estudo clínico fora dos Estados Unidos com o equipamento, em parceria com a Thermo Fisher Scientific, multinacional responsável pelo espectrômetro de massas que viabiliza a leitura molecular do tecido.
Como funciona a tecnologia
A MasSpec Pen é uma caneta conectada a um espectrômetro de massas — um equipamento capaz de identificar as moléculas que compõem uma substância e revelar sua “assinatura química”.
Em termos simples, ele pesa e compara as moléculas do material analisado, mostrando quais estão presentes e em que proporção. É a mesma tecnologia usada em investigações forenses, no controle de qualidade de alimentos e em exames antidoping — agora adaptada para uso médico.
Durante a cirurgia, o médico encosta a ponta da caneta sobre o tecido suspeito. O dispositivo libera uma microgota de água estéril, que permanece em contato com o tecido por alguns segundos. Essa gota extrai moléculas da superfície e é aspirada para o espectrômetro, que analisa sua composição química em tempo real.
O aparelho então identifica o padrão molecular do tecido — algo como uma impressão digital biológica — e mostra na tela se ele é saudável ou cancerígeno.
“É como fazer um café: a água extrai as moléculas da amostra sólida, mas não remove o tecido. A análise é instantânea e não causa nenhum dano”, explica Lívia Eberlin.
O Einstein é o primeiro centro fora dos Estados Unidos a testar a MasSpec Pen em pacientes. O estudo clínico, com duração de 24 meses, acompanha 60 pessoas com câncer de pulmão e de tireoide — tumores escolhidos pela acessibilidade cirúrgica e pela maturidade dos algoritmos de detecção.
A tecnologia já havia sido validada em um estudo publicado na JAMA Surgery em 2023, com mais de 100 pacientes submetidos a cirurgias de tireoide e paratireoide, alcançando acurácia superior a 92%.
O trabalho demonstrou que a caneta pode diferenciar, em tempo real, tecidos muito semelhantes, evitando a retirada acidental de glândulas saudáveis — uma complicação que ocorre em até 25% das operações convencionais.
As próximas etapas incluem estudos em tumores de mama, fígado e ovário, áreas em que a tecnologia já demonstrou alta precisão em testes laboratoriais e pode auxiliar na definição das margens cirúrgicas.
Os resultados obtidos no Brasil serão comparados ao exame anatomopatológico para avaliar acurácia, sensibilidade e especificidade.