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Luany Sousa

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Crime da Rua Cuba: o caso que chocou o Brasil na véspera de Natal

Na manhã do dia 24 de dezembro de 1988, um casal foi encontrado morto a tiros, deitados lado a lado, dentro de uma residência de alto padrão no Jardim América, em São Paulo

Casa da Rua Cuba | Foto: Divulgação

Em 24 de dezembro de 1988, enquanto milhões de brasileiros se preparavam para celebrar a véspera de Natal, um dos mistérios mais perturbadores da crônica policial no país ganhava forma em um endereço sofisticado de São Paulo: a casa número 109 da Rua Cuba, no Jardim América. Ali viviam Jorge Toufic Bouchabki, advogado de 45 anos, e sua esposa, Maria Cecília Delmanto Bouchabki, de 46 anos, um casal de classe alta respeitado na sociedade — ela, filha de um ex-deputado, e ele, um profissional do Direito.  

Naquela manhã de Natal, muito além de presentes e ceias, o que o país descobriria era um cenário trágico: os dois foram encontrados mortos a tiros, deitados lado a lado. Maria Cecilia com dois disparos, e Jorge Toufic com um tiro fatal e outro de raspão. O que parecia um caso isolado logo se transformou em um enigma que atravessaria décadas.

Foto: Reprodução

Uma rotina familiar interrompida

O casal vivia com três filhos menores, Jorge, o mais velho, então com 18 anos; Marcelo, de 14; e Graziela, de apenas 10 anos, que tinha uma condição cardíaca delicada que exigia atenção constante dos pais. 

Na noite de 23 de dezembro, a família reuniu-se como de costume: conversas, planos e até comemorações antecipadas porque o filho mais velho tinha acabado de ser aprovado em um vestibular de direito. Na manhã seguinte, Jorge saiu cedo, deixando um bilhete, alegando que não estava conseguindo dormir e foi ficar na casa da namorada, chamada Flávia. Por volta das 8h30, ele ligou para casa, aparentemente despreocupado, dizendo apenas: “E aí? Tá tudo bem?”, sem saber que, poucas horas depois, descobriria algo que mudaria sua vida para sempre.  

O encontro macabro

Foi a partir de um telefonema da empregada que a tragédia começou a ser desvelada. Quando o filho voltou para casa e encontrou a porta do quarto trancada, algo completamente fora do padrão para aquela família, sempre preocupada com a saúde delicada de sua filha, ele alertou as funcionárias. Após insistência, a polícia foi chamada. A porta foi arrombada e dentro do quarto estavam os corpos do casal, que foram encontrados deitados, como se ainda dormissem, sob a mesma coberta. 

Casa da Família-Foto: Divulgação

Apesar das circunstâncias gritarem que algo além de um simples acidente havia ocorrido, a investigação aberta naquela manhã já virava um enigma cheio de mistérios, e ao mesmo tempo, de erros que mais tarde comprometeriam todo o processo. 

Teorias, suspeitas e a sombra do filho

Desde os primeiros momentos, as especulações proliferaram. Uma das primeiras hipóteses foi a de um homicídio seguido de suicídio, na qual Jorge Toufic teria matado a esposa e se suicidado. Mas essa tese rapidamente caiu por terra: não fazia sentido — para matar Maria com dois tiros, suicidar-se depois, esconder a arma e ainda se cobrir com cobertas na cama seria uma sequência mpossível de um morto executar.  

Logo a seguir, surgiu a figura de um possível invasor: um homem que teria tentado assaltar a casa no ano anterior. Porém, ele tinha álibi e não morava mais na cidade.  

Foto: Divulgação - Jorge

E foi então que o foco da polícia se voltou para dentro da própria casa. Jorge, que na manhã do crime estava na casa da namorada, passou a ser o principal suspeito. Havia motivos levantados pela imprensa, como discussões familiares e resistência da mãe ao relacionamento dele com Flávia, e um “meio álibi”, já que a noite anterior e toda a madrugada eram nebulosas em detalhes concretos. 

Essa linha de investigação foi tão explorada que o Ministério Público chegou a denunciar Jorge Delmanto Bouchabki como autor do crime. Contudo, a acusação não se sustentou na Justiça por falta de provas, a arma nunca foi encontrada, e as evidências materiais que poderiam fixar a responsabilidade do jovem foram escassas ou contaminadas pela própria investigação. 

Foto: Divulgação - Jorge

Em decisões judiciais posteriores, ele foi absolvido por falta de provas em diferentes instâncias, e hoje atua como advogado, inclusive em casos de grande repercussão, como a operação Lava Jato. Mesmo assim, como muitos crimes de grande mídia, a opinião pública jamais esqueceu ou deixou de especular sobre sua possível participação.  

Cenas contaminadas e sinais perdidos

A cena do crime foi invadida por dezenas de pessoas, familiares, policiais, curiosos, imprensa. Antes da chegada sistemática da perícia. Itens como o carpete do quarto desapareceram, e pijamas das vítimas foram lavados antes mesmo de uma análise adequada.  

Foto: Reprodução/Youtube - Record

Tais erros e a falta de uma arma do crime impediram que o caso fosse esclarecido. Ao completar 20 anos, o processo foi prescrito, ou seja, não poderia mais ser reaberto segundo a legislação, e permanece oficialmente sem um culpado identificado. 

O eco do caso e sua memória

Com o passar das décadas, o Crime da Rua Cuba transformou-se em um dos mais enigmáticos casos da crônica policial brasileira É um enigma que, para muitos, permanece como um marco sombrio: na véspera de Natal, duas vidas ceifadas, um filho dividido entre suspeitas e absolvição, e uma arma que nunca apareceu. Um quebra-cabeça de silêncio, especulação e dor.

*** As opiniões aqui contidas não expressam a opinião no Grupo Meio.
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