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Luany Sousa

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Ovo de Páscoa envenenado: o que se sabe sobre o crime em Imperatriz

Uma criança de 7 anos morreu após comer um ovo de chocolate envenenado, enquanto mãe e irmã seguem internadas em estado grave

Ovo de Páscoa envenenado | Foto: Reprodução/Instagram

O que parecia um singelo gesto de carinho e celebração da Páscoa se transformou em uma tragédia familiar marcada por morte, internações e uma complexa investigação em Imperatriz, no sudoeste do Maranhão. O caso que está repercutindo nacionalmente aconteceu na quarta-feira, dia 16 de abril.

Tudo começou por volta das 19h, quando um motoboy entregou à casa de Mirian Lira um ovo de Páscoa acompanhado de um bilhete. A mensagem, aparentemente inocente, dizia: “Com amor, para Mirian Lira. Feliz Páscoa”. O presente surpreendeu a família, mas foi recebido com naturalidade.

Uma ligação

Pouco tempo depois, Mirian recebeu uma ligação de uma mulher não identificada, que questionou se ela havia recebido o ovo de Páscoa. Mirian ainda perguntou quem estava falando, mas não houve resposta — a ligação foi encerrada de forma abrupta.

Cerca de uma hora após a entrega, por volta das 20h30, o filho mais novo de Mirian, Luís Fernando, de apenas 7 anos, começou a passar mal. Diante da gravidade dos sintomas, Mirian ligou para o ex-marido — pai de Luís —, que foi até a casa dela. Juntos, levaram o menino com urgência para o Hospital Municipal de Imperatriz (HMI).

Foto:Reprodução/Redes Sociais

morte e internação

Por volta das 21h30, Luís deu entrada na unidade hospitalar. Chegou a ser entubado, mas não resistiu e morreu nas primeiras horas da madrugada de quinta-feira (17). A causa da morte ainda está sendo analisada oficialmente, mas os médicos e a polícia trabalham com a hipótese de envenenamento.

Enquanto acompanhava o atendimento do filho, Mirian começou a apresentar sintomas semelhantes aos do menino, por volta das 23h. Suas mãos começaram a ficar roxas, e ela relatou falta de ar. Foi internada e entubada na UTI do próprio hospital.

Na sequência, a filha de Mirian, Evelyn Fernanda Rocha Silva, de 13 anos, também foi levada ao hospital, já apresentando os mesmos sintomas. Ela também havia comido o ovo de chocolate. Assim como a mãe, Evelyn permanece internada em estado grave.

Foto:Reprodução/TV Mirante-Vitimas do envenenamento

Investigação e reviravolta: primeiro suspeito era o ex-marido

Com o registro da morte e dos envenenamentos, a Polícia Civil do Maranhão (PCMA) iniciou a investigação ainda na madrugada. A primeira linha de apuração mirou o ex-marido de Mirian, pai de Luís Fernando. No entanto, ao ser ouvido pela polícia, o homem prestou um depoimento considerado crucial. Os investigadores descartaram sua participação no crime ao constatar que não havia qualquer ligação dele com a entrega do ovo, nem elementos materiais que o conectassem ao ato.

Durante o depoimento, o homem revelou que sua ex-namorada, Jordélia Pereira Barbosa, de 35 anos, poderia ter algum tipo de desavença com sua atual companheira, Mirian. Foi a partir desse ponto que a investigação tomou um novo rumo.

“Os elementos todos apontavam para a participação dele, do atual ou da ex. E, nessa conjuntura toda, e com os esclarecimentos que ele deu à polícia, passou-se a suspeitar dessa pessoa que foi presa. Foi fundamental para a investigação”, explicou o delegado Manoel Almeida, delegado-geral da PCMA.

Foro:Divulgação/Redes Sociais-Jordelia Pereira

Planejamento meticuloso e disfarces

A partir do novo foco, a polícia passou a levantar registros de câmeras de segurança, comprovantes de compra e movimentações em hotéis da cidade. Descobriram que Jordélia havia saído de Santa Inês na noite anterior, chegando em Imperatriz na manhã do dia 16 de abril. Hospedou-se em um hotel e, em seguida, foi a uma loja de chocolates, onde comprou os ovos.

Imagens do local mostram Jordélia disfarçada, usando óculos escuros e uma peruca preta. A polícia acredita que foi nesse momento que ela inseriu a substância tóxica no doce. À noite, o ovo foi entregue à casa da vítima por um motoboy, cuja identidade também foi rastreada e confirmada pela polícia.

A fuga

Na madrugada do dia seguinte, por volta das 4h da manhã de quinta-feira (17), Jordélia embarcou de volta para Santa Inês. A polícia, já munida de indícios, passou a monitorar o trajeto e, com apoio da Delegacia Regional de Santa Inês, realizou a prisão da suspeita no momento em que ela desembarcava do ônibus intermunicipal, à tarde.

Com ela, foram apreendidas duas perucas (uma preta e outra loira), restos de chocolate, medicamentos e bilhetes de passagens de ônibus, incluindo uma de segunda-feira (14) — dois dias antes da entrega do ovo.

Material apreendido-Foto:Reprodução/Policia Civil do Maranhão

Motivação: ciúme e vingança

De acordo com a Secretaria de Segurança do Maranhão, a motivação do crime está diretamente ligada a um sentimento de vingança e ciúmes. Jordélia não aceitava o relacionamento do ex-companheiro com Mirian.

“Os indícios levam a crer, através de vários pontos investigados, que o crime foi motivado por vingança, por ciúme, tendo em vista que o ex-marido da autora é o atual companheiro ou namorado da vítima”, disse o secretário de segurança, Maurício Martins.

Apesar de ter confessado a compra do chocolate, Jordélia negou ter colocado veneno no ovo. A Polícia Civil, no entanto, afirma ter elementos suficientes para indicá-la como autora do crime.

Foto:Reprodução-Imagens de segurança mostram Jordélia em um hotel de Imperatriz

Perícia e próximos passos

As amostras do chocolate e do granulado encontrado com a suspeita foram encaminhadas para o Instituto de Criminalística. O laudo deve ficar pronto em até 10 dias. Amostras de sangue das vítimas também foram recolhidas para exames toxicológicos.

“No momento da abordagem dela, foi encontrado chocolate e um granulado que, possivelmente, pode ter veneno misturado. Isso vai para a perícia, que vai apontar se há ou não ligação com o que foi consumido pela vítima”, informou o delegado Ederson Martins.

A polícia ainda investiga se Jordélia agiu sozinha ou contou com a ajuda de terceiros. Ela está presa em flagrante no Presídio de Santa Inês e deve responder por homicídio qualificado e duas tentativas de homicídio.

Foto:Divulgação/Policia Civil do maranhão-Material apreendido

Questionamentos que precisam ser respondidos

Apesar da prisão de Jordélia Pereira Barbosa e dos indícios que apontam para sua autoria, o caso ainda não está encerrado. A Polícia Civil do Maranhão continua investigando pontos cruciais para fechar o inquérito com todos os detalhes e apresentar uma denúncia sólida à Justiça. Entre as principais perguntas que seguem sem resposta, estão:

    •    Qual foi exatamente a substância utilizada para envenenar o ovo de Páscoa? 

A perícia ainda está analisando o chocolate consumido pelas vítimas, bem como os produtos apreendidos com a suspeita, para determinar a substância tóxica. A confirmação é essencial para estabelecer o nexo entre o envenenamento e a origem do material.

    •    Como e em que momento o veneno foi inserido no chocolate? 

Embora existam imagens da suspeita comprando os ovos em uma loja de Imperatriz, ainda não se sabe quando e onde ela adulterou o produto, o que pode revelar se houve premeditação total e onde exatamente o crime começou a se materializar.

    •    Jordélia agiu sozinha ou contou com a ajuda de outras pessoas? 

A polícia apura se o motoboy que entregou o ovo sabia do conteúdo ou se foi apenas contratado de forma aleatória. Também está sendo verificado se houve colaboração de alguém na compra dos ingredientes, no disfarce ou no planejamento logístico.

    •    O bilhete entregue com o chocolate foi escrito por ela? 

A caligrafia ou impressões digitais no bilhete também podem ser usadas como evidência material.

    •    A escolha do horário da entrega foi estratégica? 

Entender se houve intenção de que o chocolate fosse consumido naquele momento específico pode revelar mais sobre o planejamento e a intenção por trás do crime.

    •    Há histórico de ameaças ou conflitos anteriores entre a suspeita e a vítima? 

A investigação também busca descobrir se Jordélia já havia ameaçado Mirian anteriormente, ou se há mensagens, e-mails ou registros que indiquem comportamentos anteriores violentos ou obsessivos. Essa matéria foi feita com base nas informações disponibilizadas pelo G1

Foto:Reprodução/Redes Sociais-Ovo e bilhete recebido
Novos desdobramentos

No dia 21 de abril, Evelyn Fernanda, de 13 anos, não resistiu e morreu — cinco dias após a morte do irmão mais novo, Luís Fernando, de apenas 7 anos. A mãe deles, Mirian Lira, que também foi envenenada e estava em estado grave na UTI, foi extubada no dia 20 e teve alta da UTI no dia seguinte, justamente quando recebeu a notícia da morte da filha. Ao saber, Mirian passou mal e precisou de atendimento. Em menos de uma semana, ela perdeu os dois filhos. Desde então, tem recebido apoio psicológico para lidar com a tragédia.

O laudo do Instituto de Criminalística confirmou que o ovo estava envenenado com chumbinho. A substância também foi encontrada nos corpos das crianças e no material apreendido com a principal suspeita: Jordélia Pereira.

A polícia acredita que o crime foi planejado com antecedência. Jordélia teria cometido o ataque por vingança — inconformada com o fato de que seu ex-marido havia reatado um namoro com Mirian.

Para executar o plano, Jordélia viajou de Santa Inês até Imperatriz, de ônibus. Ela chegou na manhã do dia 16 de abril e se hospedou em um hotel usando um nome falso: Gabrielle Barcelli. Se passou por mulher trans e alegou que não podia apresentar documentos por estar em processo de mudança de identidade. Apresentou até crachás falsos de uma suposta empresa de gastronomia.

Foto:Divulgação/Policia Civil

A suspeita chegou a fazer um serviço falso de degustação de trufas de chocolate em uma área próxima onde trabalhava Mirian Lira. Segundo a Polícia Civil, ela ainda apresentou alguns bilhetes supostamente falsos que seriam de pessoas que haviam comido os chocolates. Em um deles, havia escrito a mensagem "uma sensação incrível, uma explosão de sabor".  O inquérito foi encerrado, e Jordélia deve responder por duplo homicídio e tentativa de homicídio por envenenamento.

Foto:Divulgação/Policia Civil

Relacionamento conturbado

Segundo a Polícia Civil, o relacionamento entre Mirian e o ex-marido de Jordélia foi o estopim para o crime. Eles namoraram na adolescência, em Santa Inês. Depois, Mirian se mudou para Imperatriz, teve dois filhos e seguiu a vida. Já o ex dela ficou na cidade, casou com Jordélia e teve filhos com ela. O casal se separou há dois anos. Em janeiro deste ano, Mirian e ele voltaram a se relacionar à distância, o que teria irritado Jordélia. Em janeiro, ela já havia ameaçado Mirian.

Em entrevista, Mirian contou que jamais imaginaria que o presente inocente pudesse ter veneno. Disse que se lembra de estar na cozinha com os filhos, e todos comeram o chocolate quase ao mesmo tempo.

*** As opiniões aqui contidas não expressam a opinião no Grupo Meio.
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