As reduções que o Banco Central vem promovendo na taxa básica de juros, a Selic, podem ter uma consequência ruim para o consumidor nos próximos meses: o aumento da inflação.
A opinião é do professor de finanças do Insper Otto Nogami. Na ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), o Banco Central sinalizou que os cortes devem continuar.
Para Nogami, o governo vem agindo de forma "preocupante", e os preços devem começar a subir no segundo semestre. Ele defende que a taxa de juros no Brasil deveria ficar sempre num nível alto, entre 10% e 12% ano ano. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
O governo já fez oito cortes na Selic. Como o senhor avalia esses cortes?
Otto Nogami - O governo, nessa ânsia de manter o nível de consumo num determinado patamar, está reduzindo a taxa de juros. O grande receio é que essa redução trágica da taxa de juros possa, num determinado momento, fazer com que as pessoas se sintam estimuladas a consumir. Aí pode começar a acontecer uma pressão de demanda, principalmente tendo em vista a situação em que a indústria está, que é de cautela com relação ao ambiente incerto que paira sobre a economia mundial.
O perigo é que o governo, diante dessa insistência em reduzir a taxa de juros, seja pego no contrapé: que a população retome o seu ritmo de consumo e os preços comecem a se elevar, forçando o Banco Central a começar a elevar a taxa de juros novamente.
Mas a situação não tem se mostrado diferente? Desde maio o IPCA (índice oficial de inflação medido pelo IBGE) vem caindo.
Mas existe um detalhe que precisa ser considerado: o nível de inadimplência tem crescido de uma maneira assustadora nos últimos meses. Esse aumento do nível de inadimplência é a sinalização de que a sociedade está com a renda comprometida. Assim, uma das primeiras coisas que o consumidor para de fazer é consumir.
Essa queda nos preços eu atribuo muito mais a esse aumento no nível de inadimplência do que à questão da queda da taxa de juros propriamente dita. Porque a queda da taxa de juros, tecnicamente falando, vai fazer os preços aumentarem. Eu defendo a ideia de que o governo deveria manter essa taxa de juros em um patamar um pouco mais elevado.
De quanto?
Difícil dizer. Mas eu sempre defendi a ideia de que o Brasil, dada a falta de infraestrutura e a falta de competitividade, é um país tipicamente de taxa de juros alta, algo em torno de 10% ou 12%.
Então o senhor acha que, se a inadimplência cair, pode haver alta de inflação ainda neste ano?
Sem dúvida alguma. Quando o consumidor que está inadimplente conseguir equacionar seu endividamento, e isso será inevitável, ele voltará a consumir. O setor mais sensível é, sem dúvida, o agropecuário. Os fenômenos de seca e chuva já estão afetando os produtos de origem agropecuária, e isso deve se refletir nos preços.
Nesse segundo semestre a tendência é de pressão inflacionária. Devemos fechar o ano com uma inflação em torno de 5% ou 5,5%. Esse aumento deverá acontecer conforme se aproximam as festas de fim de ano e o período eleitoral. Isso normalmente aquece a economia.
O senhor acha que o governo está deixando um pouco de lado a questão da meta da inflação neste ano?
Acho que ele está muito mais preocupado em manter o nível de consumo da sociedade, porque o consumo representa quase 65% do PIB. Como o governo tem essa obstinação em manter o PIB num patamar alto, ele vai usar de todos os instrumentos possíveis para não deixar o nível de consumo cair. Mas é uma atitude um tanto quanto preocupante. É uma imprudência essa atitude de baixar mais a taxa de juros.