A Polícia Federal revelou novos detalhes sobre o funcionamento de uma suposta estrutura clandestina de inteligência na Agência Brasileira de Inteligência (Abin), durante o governo de Jair Bolsonaro. Segundo as investigações, Allan Gustavo Lucena do Norte, empresário ligado a Renan Bolsonaro, foi monitorado e difamado por agentes do núcleo político bolsonarista.
"Explodir" o alvo
Mensagens trocadas em 17 de setembro de 2020 entre os servidores Marcelo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues revelam o grau de hostilidade com que Lucena era tratado. “Explodir o Allan Lucena”, escreveu Bormevet, que recebeu como resposta: “Ele está detonando o PR?”. O termo “PR” era utilizado internamente para se referir ao então presidente da República.
Na sequência, Bormevet negou que Lucena estivesse criticando o ex-mandatário diretamente, mas fez ofensas pessoais: “Negativo. Tá iludindo o 04 do PR. Mas o cara é viado, drogado e rubroneca [flamenguista gay].”
Objetivos políticos e pessoais
De acordo com a Polícia Federal, a ofensiva contra Lucena se encaixa num padrão de atuação ilegal da chamada “Abin Paralela”, cuja função seria blindar a imagem da família Bolsonaro, neutralizar ameaças reputacionais e facilitar interesses particulares.
A corporação já indiciou 34 suspeitos no inquérito, entre eles Carlos Bolsonaro, vereador pelo PL-RJ, e o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin e homem de confiança do clã Bolsonaro.
Amizade e negócios com o "04"
Allan Lucena ganhou projeção ao estreitar laços com Renan Bolsonaro, o filho “04” do ex-presidente. Juntos, chegaram a abrir uma empresa e eram frequentemente vistos em eventos públicos.
Em 2021, Lucena foi citado em apurações sobre tráfico de influência envolvendo Renan. As investigações examinam se a proximidade entre os dois foi usada como ponte para empresários que buscavam vantagens em órgãos do governo.
Abin em causa privada
A inclusão de Lucena como alvo do esquema levanta suspeitas de que a estrutura de inteligência operava também em defesa de interesses particulares da família presidencial, e não apenas em nome do Estado. Essa conduta, segundo os investigadores, coloca em xeque a legalidade e os limites institucionais das ações de inteligência no país.