A tão esperada fumaça branca foi vista nesta quinta-feira (8) na Capela Sistina, no Vaticano, anunciando ao mundo que a Igreja Católica tem um novo papa. Eleito no segundo dia do conclave, o cardeal norte-americano Robert Francis Prevost adotou o nome Leão XIV. A escolha despertou atenção no Piauí porque remete a Leão XIII, último papa a usar esse nome, em 1878, e responsável pela criação da Diocese do estado no início do século XX.
No Piauí, estado com a maior proporção de católicos do Brasil, segundo o Censo de 2010 do IBGE, com 85% da população se declarando católica, a escolha do novo pontífice foi recebida com alegria e esperança. Em entrevista ao MeioNews, o arcebispo de Teresina, Dom Juarez Sousa da Silva, comentou sobre o que esse momento significa para a Igreja e celebrou a chegada de Leão XIV ao papado.
Dom Juarez comentou primeiramente que a condução espiritual do processo reforçou a responsabilidade e sensibilidade dos cardeais aos sinais de Deus. Para ele, a cerimônia também reafirma a união da Igreja e a competência dos cardeais que participaram do conclave. “O Espírito Santo que nos inspira é o Espírito Santo que age na vida da Igreja, e se a Igreja o escuta, na docilidade do Espírito, como fizeram nossos cardeais, que são homens maduros, de muita responsabilidade, muito bem formados e orientados, eles então nos deram, no dia de ontem, o nosso Papa Leão XIV”, afirmou.
Questionado sobre o simbolismo da escolha de Prevost em um cenário marcado por conflitos, polarizações e pelo avanço da inteligência artificial, Dom Juarez recorreu ao tom firme, conciliador e acolhedor do primeiro discurso de Leão XIV aos fiéis para refletir sobre o que se pode esperar do novo pontificado.
“Nas palavras do Papa, que começou a falar de paz em um mundo marcado por muitos conflitos, ele nos convidou à unidade a partir do seu lema: ‘Em Cristo somos um’. [É] alguém que nos conduz a construir a unidade num mundo cheio de diversidades, mas também de esperanças”, observou.
O arcebispo também declarou que o chamado à humildade foi feito com muita graciosidade pelo pontífice em suas primeiras palavras.
“E ele disse: é preciso a gente, digamos assim, desaparecer para que Cristo possa aparecer — a sua mensagem. É Cristo Jesus que deve emergir em toda a nossa mensagem. Somos anunciadores d’Ele, não de nós mesmos. E nos convidou também, partindo de Cristo, a gente cuidar uns dos outros, sobretudo dos pequenos, dos pobres. Isso é importante.”
O nome Leão
A escolha do nome “Leão”, que não adotado por um pontífice há mais de um século, chamou atenção pelo peso histórico. Para Dom Juarez, o gesto tem profundo simbolismo e sinaliza um pontificado aberto à escuta e ao diálogo com o mundo contemporâneo.
“Sabe o [nome] me trouxe? Alegria. Porque nem esperava que fosse assim, mas foi assim, e assim Deus quis. Vai ser muito importante e também isso diz algo muito forte pra nós”, declarou.
Dom Juarez lembrou que Leão XIV sucede uma tradição importante dentro da Igreja. O último papa com esse nome foi Leão XIII (1878–1903), conhecido por seu perfil conciliador e realista diante dos desafios do fim do século XIX e início do XX.
Entre os marcos do pontificado de Leão XIII está a publicação da encíclica Rerum Novarum (Das coisas novas), em 1891, considerada a base da doutrina social da Igreja.
“A Igreja tem a missão de ser sal e luz do mundo, transformando a realidade à luz do Evangelho”, disse Dom Juarez.
Ele também mencionou outros papas chamados Leão, como Leão III, que deixaram mensagens de esperança e contribuição teológica. Para Dom Juarez, Leão XIV chega com o chamado à Igreja para permanecer fiel à sua missão de caminhar com o povo de Deus.
“O que está no mundo e o que acontece têm a ver com a Igreja. O documento Gaudium et Spes já dizia: ‘as alegrias e as tristezas do mundo são também as alegrias e as tristezas da Igreja’. Porque ela está no mundo para transformar essa realidade no início do Reino de Deus. E o Reino de Deus é vida plena para todos”, explicou.
Elo com o Piauí
A escolha do nome Leão também tem um significado especial para os piauienses. O arcebispo lembrou que foi o Papa Leão XIII o responsável pela criação da Diocese do Piauí, no início do século XX.
“É uma coincidência feliz, mas é mais que isso. É graça e dom de Deus. O Papa Leão XIII criou a Diocese do Piauí no dia 20 de fevereiro de 1901, em um período muito difícil, de conturbações políticas e sociais, quando a criação de dioceses estava emperrada. E ele fez isso”, destacou.
O MeioNews apurou que a diocese foi instituída pela bula Supremum Catholicam Ecclesiam, desmembrando a Diocese de São Luís do Maranhão. O gesto marcou o início de uma nova fase de evangelização e crescimento da Igreja Católica no estado.
“Até a Proclamação da República, em 1889, havia menos de 20 dioceses no Brasil. A queda do padroado e o Concílio Plenário Latino-Americano em Roma impulsionaram a criação de novas dioceses, entre elas a nossa. Foram 82 anos de espera até a criação da Diocese do Piauí, o que mostra a importância daquele momento e do papel de Leão XIII”, acrescentou o arcebispo.
Piauí: o estado mais católico do país
Com a maior proporção de católicos do Brasil, o Piauí tem uma longa trajetória de fé, segundo Dom Juarez, construída com o trabalho de missionários e o fortalecimento das comunidades eclesiais. No entanto, o arcebispo destaca que esse título carrega responsabilidade.
“Não basta dizer que somos católicos. É preciso partir de Cristo Jesus. Precisamos viver como cristãos autênticos, com uma fé enraizada no Evangelho e na vida em comunidade. O Papa nos chama a fortalecer nossas comunidades com uma catequese que proporcione uma verdadeira experiência com Cristo.”
Para Dom Juarez, o convite do novo pontífice é claro: tornar a Igreja cada vez mais missionária, centrada na Palavra, alimentada pela Eucaristia e movida pela missão.
Compromisso com o meio ambiente
Uma das marcas do Papa Leão XIV, segundo Dom Juarez, é a postura firme em relação à crise climática. “O cuidado com a casa comum não é opcional, é uma necessidade urgente. Se não cuidarmos do planeta, viveremos catástrofes cada vez maiores. Já vemos isso agora: pessoas que não podem mais respirar, que sofrem com a poluição, com o calor, com os efeitos do aquecimento global”, alertou.
O arcebispo frisou que o Papa Francisco já havia dado esse alerta nas encíclicas Laudato Si’ e Laudate Deum, e espera que Leão XIV continue esse caminho.
“Não existe outro planeta. Ou cuidamos deste ou destruiremos o dom que Deus nos deu. O Papa Francisco foi um grande intérprete do Evangelho da vida e da criação. Agora, Leão XIV precisa continuar esse caminho, chamando a todos a uma ecologia integral que cuide das pessoas, da natureza e da nossa casa comum.”
A expectativa, segundo Dom Juarez, é de um pontificado atento aos clamores do tempo, comprometido com a justiça social, a evangelização e a preservação da criação.
Postura simbólica na Capela Sistina
Durante a primeira missa com os cardeais, celebrada nesta sexta-feira (9) na Capela Sistina, um gesto chamou a atenção: Leão XIV permaneceu ao lado dos cardeais, e não de costas para eles, como ocorre tradicionalmente por causa da disposição do altar. Para Dom Juarez, esse gesto simboliza o estilo de pontificado que se inicia.
“Ele quis se colocar ao lado, não como alguém que domina, mas como quem caminha junto. Isso é muito significativo. O Papa é o sucessor de Pedro, sim, mas é também irmão entre irmãos, servo dos servos de Deus.”
O arcebispo acredita que a atitude demonstra um desejo de comunhão e proximidade. “A finalidade é exatamente a gente caminhar juntos, respeitando as diferenças, as diversas tendências, mas a unidade é Cristo Jesus”, concluiu.